segunda-feira, 31 de maio de 2010

Eu, descrente me confesso

Que não imaginava que ainda ia ver "tribos", em Angola que não falam português. Os homens, vestidos com panos da cintura para baixo (vá lá, podia ser mais "tribal" ainda). As mulheres igualmente semi-vestidas (e de mamocas ao léu). Os homens, à minha pergunta sobre a localização de um rio, olhavam de cajado na mão como se eu fosse um ser nunca antes visto. Sem sequer pestajenarem. Apenas um, velhinho, velhinho, dava uns toques de português e pediu boleia para o posto médico porque, depreendo pelo gesto da mão em círculos na barriga, que os intestinos não iam bem. Fotos, não há. Sou ainda demasiado tímida para pedir para tirar fotos destas situações. Mas para a próxima, fica prometido. E a boleia, foi dada, está claro.

domingo, 30 de maio de 2010

Made in Angola. Porque não?

Eu, aqui no blog me confesso: gostava de saber costurar. A sério que gostava. E fazer crochet e malha mas, na realidade, só aprendi a bordar e a fazer ponto aberto em toalhas de linho. E onde isso já lá vai! Tudo isto para dizer que, se soubesse costurar (e tivesse tempo), ensinava meia dúzia de angolanas e juntas criávamos uma empresa para fazer acessórios e quem sabe roupa, com tecidos africanos*. Nada demasiadamente africano, é certo, porque para isso já existem os costureiros locais. Ora, para quem acha a ideia interessante, eu diria que umas t-shirts lisas com uns apliques com tecidos africanos ficavam supimpas. Ou umas mantas em patchwork. E sacos para levar para a praia. E... tantas coisas mais. Eu tenho um saco lindo, lindo, que trouxe da Namíbia. E existe também um site (foto reirada do site), onde se podem comprar sacos feitos por artesãos do Rwanda. E claro, existe também a Vera que morou em Burkina Faso e que lá, já deu asas à imaginação nesta área (sim, que eu não sou assim tão idiota para me lembrar destas coisas sozinha), sempre junto das mulheres locais. Outra ideia, é fazer umas compotas e uns frasquinhos de gindungo catitas. Trouxe também duma viagem a São Tomé, uma compota deliciosa de papaia. Nota-se muito que eu já comprei tudo o que queria comprar, no que diz respeito ao artesanato** que se vende cá?
*Os tecidos africanos são, regra geral, fabricados na Holanda
**E quase nenhum é made in Angola

As palavras proibidas

Já todos sabemos que em Angola (e não só) há palavras proibidas. Quando vim para cá, ainda me lembro de ouvir alguém que viveu muitos anos em Moçambique: ah, não digas preto, é negro... ou escuro. Pfff, para mim, pura hipocrisia e, o termo escuro roça até o cómico mas, adiante. Eu sei que este post pode chocar muita gente e talvez, também só o publique agora que, me parece que a Casa tem menos audiência porque, em tempos, jamais me atreveria escrever algo com este tema. Ia sair polémica na certa. E porquê escrever? Logo agora que acabei de fazer umas pipoquinhas e estava a jiboiar pelo sofá, a fazer um update pelos blogs? Porque sim. E porque acabei de ler um comentário a um post, num blog duma garota - portuguesa - que cá está, a dizer que há certos termos que xiuuuu, não podem ser ditos assim. E eu, não concordo porque acho que a intenção e a maldade é que torna esses termos "proibidos". Em tempos, ao caminhar na rua e com um "cidadão angolano de raça negra" no meio do caminho, na conversa com uma zungueira, esta diz-lhe: deixa passar a pessoa. Ele vira-se e diz: esta? Esta não é pessoa. Ora, isto foi uma forma de racimo, de preconceito, do que lhe queiramos chamar. Óbvio que não gostei e nem respondi. Dei corda às sapatilhas e fui à minha vidinha que dali, não podia resultar boa coisa. É normal que, sendo os brancos, a minoria por cá, também sintamos na pele o facto de sermos diferentes. Tudo isto para dizer que, na minha opinião, preto ou negro é a mesma coisa. Se eu uso a palavra preto? Não. Porque sei que há almas deveras sensíveis e que acham que dizer preto é completamente diferente de dizer negro. E eu pronto, aceito mas não percebo. Porque para mim, tudo depende da intenção, da entoação que se dá à palavra (que por muitas cambalhotas que dê, num blog é difícil de explicar), do grupo com quem se conversa... enfim, uma infinidade de variáveis. Também já arrisquei a perguntar a uns colegas negros que trabalhavam comigo porque não gostavam que se usasse o termo preto. Disseram que não gostavam. Preto não. E, a justificação era tão boa que eu, já nem me lembro. E, eu respeito apesar de acreditar que a carga negativa nesta ou noutras palavras, depende de quem as usa. E pronto, aqui fica a minha opinião. Os angolanos (que segundo as minhas estatísticas serão 2 dos nossos 3 leitores) que nos lêem que opinem que a malta está cá para aprender e, quem sabe, não me fazem mudar de ideias sobre esta temática.
* Confesso que até tenho medo de clicar no Publish Post

"Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões"


Cometo aqui um delitozinho e reproduzo um texto escrito pelo professor Pasquale Cipro Neto, um dos maiores conhecedoes das artimanhas linguísticas desse idioma que nos use dos dois lados do Atlântico, escrito na semana passada para o caderno de turismo da Folha de São Paulo sobre Portugal. Muito bom, o professor está de parabéns, como sempre. Os leitores da Casa vão gostar, decerto, porque também se deparam com essas situações todos os dias, assim como nós, brasileiros, ao desembarcarmos em Luanda.

A entrada em vigor da reforma ortográfica brasileira intensificou a confusão que muita gente faz entre ortografia e língua. Nas conversas aqui e ali e na imprensa, foi um tal de "Mudou a língua", "Lula assina a lei que muda a língua" etc. Isso tem valor científico igual ao de frases do calibre de "Masturbação dá espinha", "Leite com manga, morre" etc.
Reformas ortográficas, como o nome já diz, mexem na ortografia, ou seja, na maneira de grafar as palavras. Um dia já se escreveu geraes (gerais), cam (cão), portuguez (português) etc. Quando se fala de língua, fala-se do sistema, da estrutura, e isso não se muda por lei ou decreto.
A (até agora fracassada) tentativa de unificar a grafia do português nos oito países que o têm como língua oficial surgiu da suposta necessidade de igualar ou aproximar o que é desigual em aproximadamente 1% do léxico português, ou seja, a grafia.
Em Portugal, grafa-se "direcção", "adoptar", "facto", mas isso não basta para que se diga que a língua de lá é diferente da de cá. Há diferenças, sim, de timbre (abertura da vogal: no Brasil se diz "prêmio", que aqui se grafa com circunflexo; em Portugal, diz-se "prémio", que lá se grafa com agudo), de vocabulário (aqui se diz "bonde", que em Portugal vira "eléctrico"), de formas (aqui se diz "Ela está dormindo"; em Portugal, é mais comum "Ela está a dormir") etc.
Outra diferença significativa se dá na emissão das palavras: nosso português é mais aberto, mais vocálico; o de lá é mais fechado, travado (parece que sai dos dentes...). Para muitos brasileiros, isso torna a língua "deles" irremediavelmente diferente e quase incompreensível.
Pois esses dois fatores (emissão e vocabulário), além de outros, como o uso dos pronomes ("Havia um aqui, mas tiraram-no", disse-me com toda a naturalidade uma funcionária da companhia telefônica, referindo-se a um telefone público que funcionava com cartão de crédito) fazem muitos brasileiros se sentirem num país de língua estrangeira quando estão em Portugal.
Nessas horas, um pouco de boa vontade e de leitura dos grandes escritores lusitanos pode ajudar. Quem já leu um clássico português não se surpreende quando vê numa publicidade da Coca-Cola a frase "A vida sabe bem", em que se emprega o verbo "saber" (como já se empregou no Brasil) com o sentido de "ter gosto", "ter sabor" ("A vida sabe bem" equivale a "A vida tem gosto bom" -com Coca-Cola, na publicidade).
Esse contato com os clássicos lusos (e também com os brasileiros, como Machado) facilitaria a compreensão de uma frase, que lá vi há algum tempo, exibida num cartaz do Ministério do Turismo ("Açores: férias que nunca esquecem", que equivale a "Açores: férias que nunca caem no esquecimento").
O que acabei de dizer em sabe Deus quantas linhas foi resumido brilhantemente por Caetano Veloso, que, no início da sua genial e antológica "Língua", diz isto: "Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões". Está dito tudo: a minha língua (o português do Brasil) se faz roçando (com todos os sentidos de "roçar") o português de Portugal. Em outras palavras, nossa língua e a deles são a mesma coisa, embora não sejam a mesma coisa. Simples assim? Simples assim.
E que isso (as "diferenças" idiomáticas) não seja motivo para ninguém se chatear em Portugal. Se você nunca foi, vá. Vá hoje, vá agora. Se já foi, repita. Eu, que já fui inúmeras vezes, iria agora, sem hesitar. Alguns dos motivos você encontra nos outros textos deste caderno.
Antes que alguém pergunte, o tal "Acordo Ortográfico" por ora é solenemente ignorado em Portugal. E, cá entre nós, não consigo imaginar um comerciante português substituindo uma placa centenária da fachada de sua loja só porque alguns selenitas acham que "direção" é melhor do que "direcção". A coisa lá ainda não pegou. E, pelo jeito, não vai pegar. É isso.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Pequeno ensaio sobre a união angolana


Não resisti e roubei esta foto do blog da Ju. Do alto desta "mota", mil séculos de civilização nos contemplam. São oito pessoas sendo transportadas. 8 mil vezes mais felizes do que os utentes de Hummers e Prados da vida...


Luanda encontra-se em Salvador


Não há mais como separar Brasil e Angola, isso é um fato, cada vez mais evidente. A partir da próxima segunda-feira, tem lugar em Salvador, capital da Bahia - justamente a cidade que recebeu aproximadamente 4,5 milhões de angolanos na "altura" da "escravatura - uma exposição esplendorosa de arte africana, cujo convite é publicado acima (clique na imagem para ampliá-la). Leitores da Casa de Luanda na Bahia façam o favor de visitá-la.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

A Pátria de Chuteiras e de Salto Alto


Hoje a Seleção Brasileira desembarca na África do Sul. Gostaria imensamente de saber se toda a nação angolana já comprou sua camiseta, bandeira e demais adereços para torcer para o Brasil, que já é, naturalmente, o Hexacampeão da Copa do Mundo 2010.
Por aí toda a gente sabe o que significa a expressão "Salto Alto"?

25 de maio: Dia da África

Ontem foi feriado aqui em Angola, comemoração ao dia da África. A rádio Mais fez uma grande festa no Chá de Caxinde, com apresentação ao vivo do programa de rádio Raizes.

Com direito a show ao vivo de Dodó Miranda, Banda Contrastes e Gabriel Thila, venda de roupas africanas e comidas típicas de países como Moçambique, Cabo Verde, Nigéria e RDC.

Nem preciso dizer que foi bwé de bonito essa festa, né???

terça-feira, 25 de maio de 2010

Voltando ao mundo ... lentamente

Foi tão bom sentir a Casa a mexer outra vez !!! A alegria que senti ontem quando cá vim e encontrei tantos posts que me deliciaram. Umas vezes com um sorriso outras com uma lágrima no canto do olho. Senti saudades do kota Baião, é inevitável, esta Casa também era dele.
Claro que o mérito é do x de por a Casa a mexer, mas foi tão bom ler a Migas, eu sempre disse que ela tinha um "quê" inato para contar histórias, não sei como ela é na cozinha, mas graça no escrever, ela tem. E o F..., que bom também encontrá-lo aqui, mesmo dizendo que não volta, e voltando sempre, como um dia voltará, de certeza, a Luanda.

Não vim cá substituir o meu pai, não quero e mesmo que quisesse não conseguia, porque como disse um amigo meu, ele era irrepetível. Mas escrevo agradecendo o ontem ter ganho coragem de ir ler alguns emails enviados por ele, que a rapidez da doença não me tinha deixado tempo para ler, estavam a bold, aquele bold que diz que ainda ninguém os abriu.
A coragem de ir procurar o email enviado com o último livro que ele escreveu e nunca editou, e abrir os textos. Na primeira página o parágrafo:
"As pessoas não são eternas, nem insubstituíveis e mais tarde, ou, mais cedo, será inevitável o seu desaparecimento físico"
Quando ele estava no hospital, em coma, nos últimos dias, lembrei-me desse livro, lembrei-me que o tinha algures na minha inbox, e imediatamente pensei, um dia tenho que o publicar, nunca o tinha lido, até ontem.

Os textos estão terminados, não sei se ele em revisão iria alterar alguma coisa, mas sei que o vou editar, com a vossa ajuda, com a ajuda de todos que gostavam do meu pai, em jeito de homenagem, vou publicar.

Tamos juntos.
Kandandú

Agora sim eu entendi a reeleição


A reportagem da Folha de S.Paulo citada aqui ontem pelo X. teve uma continuidade. No episódio de hoje, o repórter explica a dependência da economia angolana do petróleo e encontra até um notável crescimento de outros setores, com fonte da Católica.

Além de se assustar com o preços cobrados por um café (5 USD) e um sanduíche (20 USD), ele tenta fazer uma rápida explanação do cenário político angolano, no trecho que - com a autorização do X., notório opositor das cópias de textos na internet -, reproduzo a seguir com o devido crédito:

"O futuro econômico de Angola também depende dos rumos da política. A nova constituição permitiu ao atual presidente, José Eduardo dos Santos, se candidatar. Ele deve ser o cabeça de lista do MPLA, partido do governo, em 2012. A partir daí, deve iniciar o plano de sucessão pacífica e renunciar, deixando o poder para o vice após mais de três décadas." (o grifo é nosso).

Xé, quer dizer então que o mais velho vai se candidatar à reeleição para em seguida renunciar? Epá, esses repórteres acreditam mesmo em tudo o que ouvem...

Considerações sobre o petróleo e o preço da gasolina


Olhem as ironias do mundo globalizado: Angola produz 1,9 milhão de barris de petróleo/dia e tem reserva de 14 bi - Tudo igual ao Brasil.

Enquanto o litro da gasolina custa R$ 2,70 (arredondando) em Natal, em Luanda é equivalente a R$ 0,70. Durma-se com 1 comparação dessas.

Sem contar q só há 1 refinaria em Angola, processando 3, 75 mil barris/dia, pouco mais de 50% da demanda do país. O resto é importado.

Quase o mesmo cenário da vizinha Venezuela, onde a gasolina custa quase nada. Pq no Brasil a gasolina é tão cara, algum economista explica?

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Milagre Angolano


A Folha de São Paulo, um dos dois mais influentes jornais diários do Brasil (o outro é O Estado de São Paulo), estreou um novo projeto editorial e gráfico ontem e brindou os leitores com uma longa reportagem (exclusivo para assinantes do UOL) sobre Angola.

Muitas informações nós, moradores e leitores desta Casa já sabemos de cor e salteado, mas é sempre bom ouvir uma voz a mais.

Não concordo com a prática de copiar textos alheios na internt, até porque sei o trabalho que o jornalista da Folha deve ter tido para coletar as informações ontem publicadas.

Vou falar com o editor do caderno, por sinal um amigo muito querido, e se ele autorizar os leitores da Casa serão brindados com a reportagem.

domingo, 23 de maio de 2010

Nu Feminino...Momento de Relax...


"Algures" (lol) lendo um post da Menina de Angola sobre um programa de rádio que a digníssima condômina estava escutando no carro, enquanto matava o tempo em algum engarrafamento na Samba ou no Cacuaco (estou supondo...), com entrevistas surreais com vendedores do Roque Santeiro, lembrei-me de uma coisa inesquecível no nosso cotidiano em Luanda...

Ao sair do jornal ao meio dia e ir para casa, sempre escutávamos a Rádio Nacional de Angola, na hora do noticiário do meio-dia, que começava ao som maravilhoso de tambores...São 13 horas... De Luanda, capital da República de Angola, transmite a Rádio Nacional... tum, tum, tum, tum, tum...

Já na volta para o trabalho, era a vez da audição do programa "Nu Feminino, Momento de Relax". Agora não sei se o nome do programa é mesmo esse ou se é só uma vinheta, entre uma música e outra. E se é da RNA. Não deve ser da Eclésia, com esse nome, por supuesto, não é

Ah, como era maravilhoso esse programa...!!! Músicas perfeitas para quem estava morrendo de sono, depois do almoço, preso num congestionamento colossal. Até Adriana Calcanhoto tocava...

Claudinho sempre sintonizava nesta estação e fazia questão de ensinar aos brasileiros como se pronuncia a palavra "relax", totally diferent from here...

ahahahaha, algum leitor da casa de Luanda é ouvinte do Nu Feminino?

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Semana de Gastronomia na Casa de Luanda


Tilápia reduzida no molho de tomates acompanhada de risoto com camarão

Semana de Gastronomia na Casa de Luanda


Das coisas que ando fazendo na cozinha. Críticas ou pedidos de receita nos comentários, faz favoire...

quinta-feira, 20 de maio de 2010

A Casa de Luanda voltou?

É preciso registrar que, desde novembro do ano passado, quando entrou em seu pior período de recesso, esta casa não recebia tantos posts num único mês.

Talvez seja cedo para afirmar que tenha mesmo voltado... Mas se de fato voltou, é preciso creditar aqui este retorno à energia do X., com seu incansável banzo de Angola e sua determinação para que a Casa não feche as portas de uma vez, e também à nossa querida Migas, que ensaia agora um retorno em grande estilo.

Parabéns, meus kambas, por não deixarem morrer este espaço da angolanidade.

Ah, o calor de Angola...

Mas nem tudo é mau. E depois, quando me perguntam do que gosto de cá, não hesito: do clima. Para um brasileiro, eu acredito que não faça grande diferença mas, para nós, portugueses, este clima é muito diferente das nossas 4 estações. Eu até gostava, quando vivia em Portugal, das mudanças de estação. Ora agora é Outono e as ruas enchem-se de folhas, ora a seguir vem o Inverno e com ele o meu aniversário e o frio, muito frio e os bolos ao Domingo à tarde. E depois, vem a Primavera e o início dos dias bons e, a seguir o Verão e as férias e a praia com as inevitáveis nortadas e a água de mar que gela até aos ossinhos para quem mora no Norte, como eu, que vivo a 200 metros da praia e acho que já não vou lá, de bikinolas e toalha desde que estou cá. Faz 4 anos este ano. No entanto, desde que descobri o Verão o ano todo, não quero outra coisa (por hoje, amanhã logo se vê). Também já ouvi vozes contrárias que o calor daqui não é bom, que é calor demais. Vão para a Suécia. É melhor. Quando regresso a Portugal de férias, sobretudo no Inverno, sou menina para ficar em casa aí uns 3 dias, todo o dia de pijama, com o aquecedor a apontar para as perninhas. Ai que frio, ai tanta chuva e nhãnhãnhã... Depois, é que começo a conviver. Claro que também vou sentir falta de algumas pessoas. E de um mufetezinho. Mas acredito, que quando for uma velha jarreta, nos convívios familiares assim, tipo Natal, vou contar sempre a mesma história. Ah o clima, as praias, o mar, as saídas com vestidinhos esvoaçantes, as festas nos terraços dos amigos, pela noite dentro sempre, mas sempre com calor bom. E todos continuarão a comer as batatas com bacalhau (se entretanto o gajo não estiver extinto), ou o assado com esparregado, a olhar para o prato e a ignorar a 337ª vez que eu falo em Angola e no clima (naquele ano).

quarta-feira, 19 de maio de 2010

No dia em que Luanda mudou para mim

Acabo de ler este post do Miguel. E ainda estou nervosa, só de o ler. Com aquela sensação que se tem quando se vê um filme de suspense ou, no meu caso, também antes dos testes na escola. Pela primeira vez aqui no blog decidi também falar da experiência que vivi, quase há um ano. Na altura, achei por bem não escrever nenhum post. Não por mim, por não querer recordar. Mas pelas vozes dos merdosos que eu sei que iam aparecer a perguntar se no meu país também não há assaltos e blá blá blá pardais ao ninho. E eu, sinceramente, não tenho pachorra para gente estúpida. Porque haver há. Eu é que em 30 anos de existência, nunca vivenciei nenhum. Em Portugal ou nos países para onde viajei. Nem ninguém da minha família ou amigos. E também não moro propriamente em Carrazeda de Ansiães. O mesmo já não posso dizer dos amigos/colegas que vivem em Luanda. Mas, adiante. Quando fui assaltada, ia sozinha. Ia ter com uns amigos para jantar. Estacionei ao lado do restaurante, também na ilha. A partir daí foi o inferno. Os parvalhões - dois - não iam armados. Ou pelo menos, eu não vi nada. Até porque, dois matulões, visivelmente alterados com álcool ou drogas, não precisam de grande ginástica para me assaltarem. O problema é que eles não disseram nada. Não pediram nada. Um avançou logo a enrolar-me o braço no pescoço, a tapar-me também a boca e o outro, a procurar pelo que podia. E eu, esperneei, gritei porque sinceramente não pensei que aquela merda fosse só um assalto. E resisti. Muito. Já no meio do chão, abri a mão e dei-lhes o telemóvel que levava. A perda foi só essa. "SÓ". Ainda perguntaram se eu tinha mais alguma coisa e eu, com um sangue-frio inimaginável disse que não, sentada no meio do chão, e com o dinheiro no bolso de trás. Fiquei toda dorida nos dias que se seguiram, pescoço e orelhas inchadíssimas e um pé arranhado. Os camaradas à volta, que acham que controlam os nossos carros, nada. Só olhavam, talvez tão assustados como eu, não fosse a seguir chover também para eles. E pronto, depois disto a minha vida em Luanda, nunca mais foi a mesma. E agora, quando me perguntam qual é, para mim, o pior problema de Luanda, eu respondo: a segurança. Esta não foi a única situação de perigo. Tive outra, há poucos meses. Outro parvalhão, desta vez com um faca. E eu, em pânico (e feita estúpida), voltei a resistir mesmo depois do primeiro episódio me ter mentalizado que jamais resistiria novamente. Mas não. Desta vez pirei-me virada de costas para ele. O que é sempre bom quando o gajo que vem atrás de nós tem uma faca na mão. O que me safou é que aquele era um bandido ingénuo, um baby-bandido, e seguiu a vida dele quando viu que eu ia dar trabalho. Não fui feita para ser assaltada, está visto. Esta última, ainda por cima, foi num fim de tarde no regresso a casa depois de ter tido um acidente de carro, também o mais violento nos meus 30 anos de existência (culpa do outro que bateu por trás a uns, sei lá, 80km/hora), naquela "autoestrada" ali para os lados da Corimba. Já em casa, lembrei-me do que um amigo me tinha dito depois do outro assalto. "Nunca acontecem dois azares no mesmo dia". Pois. Parece que em Luanda tudo pode acontecer.

Reunião de Condomínio


E aconteceu mais um encontro memorável de alguns moradores e personagens desta Casa de Luanda na última sexta-feira, desta feita na casa de ninguém menos do que Ju, nossa intéprida pululante dos dois lados do Atlántico. Viajei 3 mil quilómetros para encontrar a malta, só senti falta do F., autor desse condomínio virtual.


E foi bom demais: rimos, demos risadas, lembramos de Luanda, Ju mostrou fotos da nova cara da cidade e prometeu mas não mostrou um depoimento mandando pelo Kota 50.


Deixo a foto do meu anel como prova de aliança eterna com todo esse povo querido.


segunda-feira, 17 de maio de 2010

Para o X: O padeiro que me queria criar

Algures na província do Kunene, em viagem profissional, paro para comprar pão. A cerca de 100km da cidade de Ondjiva, era o melhor pão da região, dizia o meu colega que vive lá. Entramos na padaria. Cá fora, um dos padeiros, velhote, conversava com uma garota. Falavam sobre mim e, nós ouvimos. Deliciados.
Padeiro: Não tenho dinheiro para criar uma branca destas.
Garota: Pois não.
Padeiro: Uma branca destas fica cara. E como é linda. Mas eu não tenho dinheiro para a criar.
Garota: Xé, cala a boca. Não vê que ela está acompanhada pelo marido?
Padeiro: Não é marido. É pai.
Tudo isto, sem qualquer pudor. Sem medo de ser ouvido. Com a ingenuidade característica de Angolano da província. Cá fora, ainda conversamos um pouco. Ele pergunta-me o nome e diz que tem um filho com o mesmo nome. Fiquei na dúvida. Que queria mesmo dizer ele com "criar"?

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Aerograma

Um dos últimos post que escrevi aqui na Casa, também foi para publicitar um livro. O livro do nosso querido FBaião*. Desta vez, não posso também deixar de referir que o nosso "vizinho" Afonso Loureiro do blog Aerograma terá publicado brevemente o seu livro, inspirado no blog que escreve diariamente, a partir de Luanda. E eu, fico bem feliz, caneco! Porque, apesar de não o conhecer pessoalmente, sempre gostei bastante do blog dele. Sobretudo porque vi o blog crescer já quando estava em Angola e, muitas das visões eram partilhadas. Muito mais tinha para dizer mas... o blog e agora o livro, falarão por mim!
* E como é bom voltar a ler as "conversas" com o FBaião!

sexta-feira, 7 de maio de 2010

O Mundo é pequeno ou Angola que é grande demais?

É incrível como Angola impregna na vida da gente. Parece que o ditado que diz que quem bebe da água do rio Bengo jamais vai embora de Angola é verdade. A gente pode não estar fisicamente, mas vai estar sempre presente de uma forma ou de outra.

Nos últimos meses estive mais tempo em SP do que em Angola, e estava na casa de uma amiga que mora na Austrália quando uma amiga da irmã dela, que mora nos EUA, veio puxar papo comigo, queria saber mais sobre Angola.

Ela me descreveu Angola perfeitamente e quando eu perguntei se ela conhecia Luanda, ela disse que não. Disse que conhece Angola pelos livros do Agualusa e que conheceu Pepetela nos EUA.

Mundo pequeno...

De volta a Angola, mesmos sons, mesmos cheiros e o caos de sempre. Bom estar de volta. O namorado me liga: Você conhece a Juliana Borges? Acabei de conhecê-la...

Mundo pequeno... rs

quinta-feira, 6 de maio de 2010

As delícias portuguesas das quais tb morro de saudades...

Um amigo jornalista muito querido passou a semana passada em Lisboa, a trabalhar. Como ninguém é de ferro, a-ca-bou-se de comer nas padarias portuguesas e deixou esse relato delicioso (que copio sem pedir-lhe licença, dado o grau de amizade) aqui. A saudade das doçaria portuguesa, que conheci em Luanda com seus palmieres e pastéis de natal é a mesma. Fica o relato do Caco para os leitores da Casa de Luanda.

Tentações

Vou sair de Portugal casado. Com uma padaria. Não tem gente que se casa com bonecas ou com travesseiros? Então, eu vou entrar em compromisso sério com uma padaria portuguesa. Ou, em último dos casos, só juntar os trapos mesmo e morar dentro de uma. Porque é a maior perdição que vi na vida ên-tê-ra.

É toda a sorte de salagados doces que você puder imaginar: rissol de camarão, croquetes, pastéis de nata, queijadinhas de Évora, baba de camelo e outros nomes não somente inventivos, como também visualmente atraentes. E, paladarmente falando, coisa dos céus. Literalmente. A maioria dos doces todos são feitos com ovo. Ou, mais especificamente, com a gema do ovo e são chamados de (oi?) "doces conventuais".

Conta-me uma senhôura portuguesa (com mais bigode do que eu, meu pai e meus dois irmãos juntos) que isso tem um motivo histórico. Antigamente as freiras usavam as claras para engomar seus hábitos e precisavam fazer uso das gemas. Todo mundo sabe que jogar comida fora é pecado, néam? Então tiveram que inventar doces com elas. A gula agradece. Vou comer tudo o que for possível e voltar ao Brasil em formato de bola de canhão. Só não tive coragem de provar os croquetes d'ovos porque, né, caganeira em Lisboa, quem curte?

terça-feira, 4 de maio de 2010

Sobre a volta da Ju à Luanda

Graciete, Ju e Claudinho: reencontro emocionado em Luanda
Causou frisson imenso no Teatro Alberto Maranhão a simples leitura deste email abaixo, enviado pela Ju de Luanda no exato momento que que palestrávamos sobre Angola, como dito no post passado. A pedidos, segue parte desse texto que tanto nos emocionou. Tanto pelo relato dela em si quanto pela notícia maravilhosa de que o nosso querido Claudinho fez o Pedido à Graciete e que essa já está grávida de 8 meses....ah...esse Claudinho...

Queridos amigos, é mto boa a sensação de estar de volta a Luanda. E na hora bate uma saudade enorme de vcs todos, que viveram os dias comigo aqui.

Fui ontem na redação, apareci de surpresa, mas ja nao havia quase ninguém lá, pois ja estava quase na hora do sol se por. Foi mto boa a a sensação de eu andando rua rei Kathyavala acima e subindo aquelas escadas (...). Tudo continua igual. Estavam la o CHimuco, Vigas, Alcreto Concreto, Ismael.

O 50 está no Namibe, volta sábado, vou encontrá-lo, ele levou o maior susto quando atendeu o telefone. E nao morreu de ataque do coração, hahaahha.

E a maior novidade é que eu liguei pro Claudinho.. ele gritava tanto no telefone de alegria que eu nem conseguia entender o que ele dizia. Mas enfim consegui entender que amanhã ele vai fazer o pedido à Graciete!!!! E eu vou pra lá, obviamente. Não é incrível?

(...)


Enfim, essas sao as novas. Das próximas vezes estejam por aqui tb! Vcs fazem bué de falta!

beijos enormes pra vcs.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Sobre as saudades do X. - que são a de toda a gente

A próposito do pedido do X. para que cá voltemos todos a escrever como se fazia no antigamente, preciso deixar uma resposta pública.

Eu, uma praia no Kwanza Sul, o pôr do sol
de Angola: saudades que nunca acabam


X., meu kamba, como sabes bem, não há dia em que eu não pense em Luanda, ou não me recorde com saudades da vida que lá tinha, tão breve e tão intensa.

Talvez sejam mesmo essas saudades mal curadas que me impeçam de voltar a escrever, aqui ou em qualquer outro lugar... Depois de Luanda, nunca mais tive blog (e aí está a tentativa da Casa da Garoa para atestar esse fracasso).

Fico feliz com os encontros que tivestes com o Agualusa e o Ondjaki, escritores que tanto admiro. Do Agualusa já li quase tudo o que publicou, (o 'Barroco Tropical', que devorei no início do ano, é LITERATURA da melhora qualidade, não só angolana, mas internacional); à prosa do Ondjaki, tão marcada pelo ritmo e gírias de Luanda, recorro sempre que me apertam as saudades do sotaque da capital. Se ainda não o conheces, não demora mais. Recomendo-te, para iniciar-te, 'Bom dia Camaradas'. Vais ficar encantado com a narrativa do miúdo que nos guia por suas aventuras de criança por uma Luanda pré-capitalista.

Queria ter a tua força para continuar a viver Angola, amigo X., mesmo estando tão longe de lá. ,

Kandandu forte do amigo.

F.

P.S. - Por fim, gostava imenso de receber a carta da Ju, se não for algo muito pessoal. Nem sabia que andava ela por Angola de novo... Inveja.

sábado, 1 de maio de 2010

O meu reencontro (literário) com Angola

A Marginal e a baía de Luanda sob a luz do Cacimbo: saudades imensas

Neste dia Internacional do Trabalho, volto à esta Casa, também motivado pela postagem da querida Migas, para contar a vocês um episódio que vivi ontem - e ele revelador de como, para sempre, Angola e suas histórias estarão ligadas a minha pessoa, não tem mais jeito.

Teve lugar em Natal, entre quarta-feira e ontem, o I Encontro de Escritores de Língua Portuguesa, reunindo artifícies desse idioma que nos une em 10 países.

Escritores e leitores de 8 países lusófonos confraternizam no Teatro Alberto Maranhão

Foi um encontro muito, muito fixe, para usar uma expressão aí desse lado do Atlântico.

Esse evento é um dos primeiros frutos concretos da I Semana de Natal em Lisboa e, na sequência, de Lisboa em Natal, ocorrida no ano passado e narrada aqui e aqui. Das duas semanas de visitas mútas surgiu a Associação Cultural de Amizade Lisboa/Natal. Minha cidade entrou para a União das Cidades-Capitais de Língua Portuguesa (mais informações aqui), como Luanda e outras capitais africanas já são há um bom tempo. Salvador é outra representante do lado de cá.

Vista aérea de Natal, a partir da praia de Areira Preta: jóia do Atlântico na esquina do Brasil

Veio toda a gente de todos os países lusófonos para Natal e a minha cidade transformou-se, por três dias, na capital internacional da Língua Portugesa: Brasil, Portugal, Angola, Guine-Bissau, Cabo Verde, Moçambique, São Tomé e Timor Leste.

Foi, para mim e para a gente da minha terra, motivo de muito orgulho receber tantos irmãos e, em particular para este datilógrafo, um motivo de honra fazer parte de uma mesa ontem onde estiveram, ao mesmo tempo, dois dos maiores representantes das letras angolanas contemporâneas: Ondjaki e José Eduardo Agualusa. Tudo isso aconteceu ontem e o registro fotográfico, espalhados neste post, são do meu amigo e fotógrafo Canindé Soares.

Com o Agualusa, o reencontro foi mais para o sentimental. Eu já havia conhecido-o na Festa Literária Internacional de Paraty, a Flip, como palestrante, e depois pessoalmente em São Paulo, um dia antes de embarcar para Luanda, em 2008. Na ocasião, ele palestrava numa livraria deliciosa do meu antigo bairro paulistano, a Vila Madalena, com outra fera angolana: o Pepetela.

Li As Mulheres do Meu Pai no avião rumo à África, estou avançando nas páginas de Barroco Tropical (tão bem resenhado aqui pela Cota Maria aqui) e, brindando os presentes ao encontro, Agualusa leu um trecho inédito do seu próximo livro, cujo ponto final foi colocado no avião ao vir para cá. A curiosidade já me tomou de assalto. Para além dos livros de história, foi na literatura angolana que entendi muito desta terra, como também relatei aqui.

Já com o Ondjaki, de quem ainda não li nada, valeu a pena somento ouvir, ouvir como quem consome um bom vinho, aquele sotaque tipicamente luandense, pausado, cadenciado, enfático, até certo ponto agressivo, mas muito, muito luandense, tanto quanto as dezenas de amigos que fiz nesta cidade. Vou procurar hoje mesmo um livro do jovem escritor, que também vive no Rio de Janeiro.

O kamba, se assim posso chamá-lo, foi de uma simpatia incrível ao narrar casos de família e suas relações com a internet (como é diferente o jeito que os angolanos pronunciam "internet". Por outro lado, da mesa também surgiram tiradas engraçadas ao lembrarmos como, dos dois lados do Atlântico, a língua pode até ser a mesma, mas algumas coisas são difícies de serem entendidas sem o fundamental Pequeno Dicionário Angolano que esta Casa vem compilando desde que nasceu - e um dos motivos do seu sucesso.

Por fim, e aqui vai uma nota triste, queria deixar registrado o meu desejo - também o dele! - de ter tido aqui em Natal, neste encontro, o Fernando Baião, um dos moradores desta Casa que nos mês passado fez sua viagem última rumo á Casa do Pai. Fernando, você, de onde estiver, esteve conosco em pensamento.

Da Associação Cultural de Amizade Lisboa/Natal, presidido pelo senhor Carlos Marques, criada no ano passado, surgiu este encontro, cuja segunda edição já tem data marcada: 26, 27 e 28 de abril de 2011. Que venham muitos mais escritores africanos, portugueses, timorenses e brasileiros para cá, como forma de estarmos cada vez mais irmanados nessa coisa única, maravilhosa e gostosa que é ser um falante de Língua Portuguesa.

Em breve, darei aqui notícias de como vocês vão assistir, no conforto do seu lar, um resumo do que foi esse EELP em Natal.

Nota final: por estes dias, como se um ciclo mágico de reencontros com Angola se reatasse, "aterrou" em Luanda a nossa querida Ju, uma das brasileiras que mais conhece essa gente e essa terra. Na ocasião do EELP, li para a platéia um email que ela me mandou, no exato momento da palestra, contando sua emoção de rever Luanda. Uma pérola literária. O teatro Alberto Maranhão veio abaixo em palmas.

É hora, portanto, desse blog viver a efervecência diária de 2008.